domingo, 28 de dezembro de 2008

Gestalt e Psicologia da Morte (Parte IV)

Situações Inacabadas e Morte


Continuando a linha de raciocínio sobre a morte e o viver, é imprescindível
falarmos sobre as situações inacabadas, e como elas estão relacionadas aos
processos de perdas e luto.
Uma situação inacabada ou Gestalt incompleta é toda experiência que fica
suspensa até que a pessoa a conclua. A maioria das pessoas possuem uma
grande capacidade para tolerar situações inacabadas. Entretanto, estes
movimentos que não são completados buscam naturalmente um complemento e,
quando se tornam suficientemente poderosos, o indivíduo é envolvido por
preocupações, comportamentos compulsivos, cuidados, energia opressiva e
muitas atividades auto-frustrantes. É a auto-regulação organísmica fazendo
seu papel, buscando o equilíbrio. Por exemplo, se você não xinga seu chefe
no trabalho, mas gostaria realmente de fazê-lo, e então vai para casa e o
faz com seus filhos, há grandes probabilidades de que isto não funcione
porque é somente uma tentativa fraca ou parcial de terminar alguma coisa que
de qualquer maneira ainda está suspensa, inacabada. Uma vez que a
finalização foi alcançada e que pode ser experienciada plenamente no
presente, a preocupação com o antigo não-completamento é resolvido e a
pessoa pode caminhar para as possibilidades atuais, no Aqui-Agora.
No luto, as situações inacabadas emergem geralmente como um sentimento de
culpa. Em diversas situações de perda, como por exemplo, em suicídios, em
situações em que a pessoa falecida passou muito tempo debilitada por alguma
doença forte e foi acompanhada com angústia pelos familiares, em casos de
acidentes em que há sobreviventes, em situações em que há desentendimento ou
mágoa entre o morto e os que ficaram, há quase sempre presente o sentimento
de culpa. Seja por não ter vivido tudo o que queria com a pessoa que se foi,
ou por se achar causador da morte de um suicida, ou pelo arrependimento por
não ter passado os últimos momentos do falecido em harmonia com ele, muitas
pessoas carregam em si esse sentimento negativo. A culpa pode travar a vida
de uma pessoa por muito tempo, e geralmente esse sentimento está presente
até mesmo no dormir e no acordar desta pessoa, tornando-se um tormento
cotidiano.
Do fechamento das situações inacabadas depende o processo de luto saudável.
Num indivíduo integrado os processos de formação e destruição de Gestalten
são ininterruptos. As despedidas mal-feitas e os olhares mal dados às
vivências de perdas são fatores cruciais para entender como interrompemos
nosso fluxo auto-regulativo, e ficamos impedidos de viver plenamente no
momento presente.